A Fascinante Jornada do Tarot: De Jogos Nobres a Oráculo Moderno
- Fabiana Salles
- 29 de jul.
- 3 min de leitura
O Tarot, com suas imagens enigmáticas e simbolismo profundo, é hoje amplamente reconhecido como uma poderosa ferramenta de autoconhecimento e orientação. Contudo, sua trajetória é muito mais complexa e secular do que muitos imaginam, com origens que remontam a jogos de cartas da nobreza italiana e uma evolução que o transformou de passatempo em um sistema esotérico.
O Berço do Tarot: A Itália Renascentista
Surpreendentemente, o Tarot não nasceu em templos místicos ou círculos de ocultismo. Seus primeiros registros apontam para a Itália do século XV, onde era conhecido como "Trionfi" (Triunfos) ou "Carte da Trionfi". Essas cartas eram baralhos de jogo de luxo, frequentemente encomendados por famílias aristocráticas como os Visconti-Sforza.
Os Arcanos Maiores, que hoje nos parecem tão místicos, eram então figuras alegóricas que representavam virtudes, classes sociais, planetas e conceitos como a Morte ou a Temperança. Eram uma manifestação artística da cultura renascentista, cheios de simbolismo clássico e cristão, usados para um jogo de truque complexo, precursor de jogos de cartas modernos. Não havia, nesse período, qualquer associação direta com adivinhação ou esoterismo.
O Surgimento da Conexão Esotérica
Foi somente séculos depois, especialmente a partir do século XVIII, que o Tarot começou a ser reinterpretado sob uma lente esotérica. Figuras como Antoine Court de Gébelin, um pastor protestante e maçom francês, publicaram obras que ligavam o Tarot a mistérios egípcios antigos e à sabedoria primordial, embora sem evidências históricas concretas. Em seguida, Jean-Baptiste Alliette (Etteilla), contemporâneo de Gébelin, foi o primeiro a publicar um baralho de Tarot projetado especificamente para a adivinhação, atribuindo significados específicos a cada carta e à sua posição (invertida ou não).
Esses pioneiros abriram as portas para a popularização do Tarot no submundo ocultista, pavimentando o caminho para as diversas escolas e tradições que conhecemos hoje.
As Principais Escolas do Tarot Moderno
Atualmente, três grandes "escolas" ou tradições de Tarot dominam o cenário, cada uma com sua própria estética, filosofia e abordagem interpretativa:
1. O Tarot de Marselha: A Tradição Clássica
Considerado por muitos o baralho "pai" do Tarot esotérico moderno, o Tarot de Marselha representa uma linhagem de baralhos produzidos em massa na França a partir do século XVII, embora suas raízes remontem aos baralhos italianos originais. Suas características mais marcantes são:
Estilo Visual: Imagens mais simples, estilizadas e com cores primárias, lembrando xilogravuras.
Arcanos Menores "Pips": Diferente dos baralhos modernos, os Arcanos Menores (de Ás a Dez de cada naipe) não são ilustrados com cenas narrativas. Eles mostram apenas os símbolos dos naipes dispostos geometricamente (por exemplo, sete moedas para o Sete de Ouros).
Interpretação: A leitura do Tarot de Marselha muitas vezes se baseia mais na numerologia, nas formas geométricas e na interação entre as cartas, exigindo do leitor uma capacidade de "ler" o movimento e a energia visual das imagens abstratas. É a base para muitas escolas de Tarot francófonas e para abordagens que valorizam a estrutura arquetípica pura.
2. O Tarot Rider-Waite-Smith: O Gigante da Popularidade
Publicado em 1909 por Arthur Edward Waite, um membro proeminente da Ordem Hermética da Aurora Dourada, e ilustrado pela artista Pamela Colman Smith, o Tarot Rider-Waite-Smith (RWS) revolucionou o mundo do Tarot e se tornou o baralho mais influente e amplamente utilizado globalmente. Sua grande inovação foi a ilustração completa e narrativa de todos os 78 Arcanos, incluindo os Menores.
Ilustração Detalhada: Cada carta, até mesmo o Oito de Ouros ou o Sete de Copas, conta uma história visual com personagens, paisagens e objetos. Essa riqueza imagética facilita enormemente a interpretação intuitiva, tornando-o acessível tanto para iniciantes quanto para tarólogos experientes.
Simbolismo Esotérico: Waite e Smith incorporaram um vasto leque de simbolismos ocultistas, astrológicos, cabalísticos e da mitologia cristã, adicionando profundidade a cada imagem.
Legado: A vasta maioria dos baralhos de Tarot modernos são variações, homenagens ou inspirações diretas do estilo e do simbolismo do RWS, solidificando seu status como o cânone contemporâneo.
3. O Tarot Thoth: A Profundidade Ocultista
Concebido pelo controverso ocultista Aleister Crowley e pintado pela artista Lady Frieda Harris, o Tarot Thoth foi publicado postumamente em 1969. É um baralho de imensa complexidade e beleza, profundamente enraizado nos sistemas thelêmicos de Crowley, na Cabala, na astrologia e na numerologia.
Estilo Artístico: As ilustrações são vibrantes, abstratas e carregadas de símbolos multifacetados, muitas vezes com um toque surrealista e geométrico. Elas foram criadas com base em extensas instruções de Crowley para representar conceitos esotéricos avançados.
Abordagem Complexa: O Thoth é geralmente considerado mais desafiador para iniciantes devido à sua densa camada de simbolismo e à necessidade de familiaridade com os sistemas ocultistas que o informam. Contudo, para quem se dedica ao seu estudo, ele oferece uma profundidade de insight e uma visão cosmológica rara.
Foco na Magia e Filosofia: Mais do que apenas um oráculo, o Thoth é frequentemente visto como um livro de sabedoria e um mapa para a jornada espiritual e mágica, refletindo a filosofia thelêmica de Crowley.
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